Segunda parte da entrevista dada e publicada no site http://www.anaf.com.br
11 – Por que o mesmo árbitro que no Brasileiro marca qualquer esbarrão como falta não marca nada em jogos da Sul-americana?
R – O árbitro internacional, por sua experiência, sabe como as equipes e os países jogam. Uma partida no sul do País, por exemplo, tem uma característica totalmente diferente da que é jogada no Norte. Portanto, a adaptabilidade deve ser um atributo do grande árbitro. Cada competição tem sua característica específica. A luta das comissões é aproximar o máximo a forma de atuar, isto está sendo feito e tem melhorado muito, mas ainda falta muita coisa por se fazer. Falta é falta em qualquer país. A diferença é que no Brasil, os jogadores são manhosos. Cada estado tem uma característica de jogo e de arbitragem. Mas, é crível que, até 2012, vamos estar bem mais próximos. O projeto do Dr. Ricardo Teixeira é aproximar ao máximo o critério de arbitragem. Agora, comparar o número de faltas da Europa e da América do Sul é o mesmo que comparar a vida do europeu com os americanos do sul… Uma distancia muito grande, pelo menos de cultura.
12 – Muitas vezes os árbitros fecham os olhos a certas faltas em prol do espetáculo. Isso é uma orientação da comissão?
R – Não. A comissão exige o cumprimento da regra do jogo, que é treinada pela comissão de ensino. No caso da CBF, os orientadores são Antônio Pereira da Silva/GO, Jorge Paulo de Oliveira Gomes/DF e Márcio Rezende Freitas/MG. Eles é que repassam as informações da FIFA. Nós acompanhamos e, claro, temos o dever de cobrar o que foi ensinado por eles. Agora, temos é que ampliar o número de instrutores. A nossa vontade é termos de 12 a 15 instrutores. Vamos atrás deles. Espero que, em mais dois anos, possamos realizar outro curso para instrutores. No próximo curso promovido pela Fifa, teremos Aristeu Tavares, Manoel Serapião e Silvia Regina de Oliveira (para o quadro feminino). Vamos buscar mais uma vaga junto a Fifa. Temos excelentes opções, tais como José Mocellin, Edson Rezende, Roberto Perassi, Sérgio Cristiano, Milton Otaviano e outros que poderão colaborar muito com o projeto.
13 – Sorteio para os árbitros: todo mundo é contra ou diz que é. Então, por que não acaba?
R – Por ser uma Lei Federal (Estatuto do Torcedor) e somente se extingue se a mesma mudar. Cabe as entidades lutarem pelo fim do sorteio, principalmente por conta da renovação, pois nem sempre temos como preparar um jovem árbitro para as principais divisões correndo o risco do sorteio levá-lo a uma partida que exige experiência. Não temos, às vezes, jogos suficientes para promover mais do que gostaríamos, mas temos que trabalhar enquanto ela perdurar.
14 – Publicidade nas camisas dos árbitros, o que pensa sobre este assunto?
R – É um dos caminhos que está sendo estudado. O que falta é interesse das grandes empresas. Se eles soubessem que, em 2007, tivemos 6.305 profissionais em todos os estados da Federação trabalhando 90 minutos, com exposição para milhões de pessoas nos estádios e, principalmente, na televisão talvez pudessem aproveitar os espaços permitidos pela Fifa. Por exemplo, neste último brasileiro tivemos um aumento de público na ordem de 70%, com 17 mil pagantes por partida. São números significativos. O assunto é da órbita da Diretoria de Marketing e tenho certeza de que o responsável estuda o assunto. Quem sabe em mais um ou dois anos isto seja possível.
15 – Entra ano e sai ano, os treinadores, torcedores e a Imprensa reclamam dos árbitros. Eles têm razão ou faz parte da cultura do futebol?
R – Faz parte e sempre será desta forma. Basta o primeiro erro. No Brasileirão 2007, levantaram 10 “graves” equivocos, em 380 jogos… Se um árbitro tem uma média de decisões entre 160 e 180 por partida e somente conseguiram editar tais equívocos, acreditamos que avançamos muito. Devemos registrar, ainda, que entra ano e sai ano e os treinadores perdem empregos após algumas derrotas. Com um olhar mais crítico saberíamos que a “pressão” em cima dos dirigentes, treinadores e jogadores é imensamente superior ao que se faz com os árbitros. É só observar melhor, ler, ouvir e ver o que a mídia nos apresenta.
16 – Quando um árbitro pode ser considerado “pronto”?
R – Quando ele mantém uma regularidade por vários jogos e temporadas. O árbitro não pode ter um desempenho igual ao resultado de um eletrocardiograma…
17 – Quais as qualidades para ser um bom árbitro ou assistente?
R – São vários os atributos. A pirâmide do sucesso nos apresenta vários: laboriosidade, amizade, lealdade, cooperação, entusiasmo, controle pessoal, estado de alerta, iniciativa, concentração no objetivo, condição moral, física e mental, habilidade na execução da tarefa, espírito de equipe, equilibrio, confiança, grandeza competitiva, sinceridade, honestidade, confiabilidade, paciênca, fé, luta, esforço, adaptabilidade, ambição positiva, etc. Acertar os lances considerados fáceis, temos muitos, o que procuramos é aquele que acerta os ajustados, o diferenciado.
18- Os pré-requisitos para ser árbitro hoje em dia incluem ter estatura, estudo, cultura. Não estaria faltando o “dom” de ser árbitro por vocação?
R – Não existem requisitos tão complexos. O futebol moderno exige cultura para entender a necessidade da performance física em todos os sentidos (mudança de hábitos, alimentação, descanso) e, claro, o dom é primordial. Mas quantos “Pelés”, “Zicos”, “Romários”, “Leônidas” temos no futebol? Existem “craques do apito”, “bons do apito”, “regulares do apito” e assim sucessivamente. Apenas os que detêm o dom é que chegam mais longe. Isto é inegável, mas existe espaço para todos que tenham vontade.
19 – Grandes árbitros do passado, hoje, não estariam no quadro, pois não teriam estatura e nem cultura o suficiente para ingressar no meio. Não é um retrocesso?
R – O passado tinha sua característica. O futebol era lento, hoje é acelerado. É como dirigir um Ford 29 e uma Ferrari nos dias atuais. Tudo evolui e na arbitragem não seria diferente. Hoje, qualquer jovem que queira assistir uma partida da Copa 70 ou dorme ou muda de canal. Cada época deve ser vivida e aproveitada, mas não pode servir como comparação. Imagine que passamos séculos sem celular e computador e hoje, viveríamos sem eles? Mudou e para melhor!
20 – O que pesa mais: correr, dominar o inglês ou saber apitar uma partida corretamente?
R – Sempre apitar e assistir ao árbitro bem. A questão física é um pilar relevante, pois o futebol está cada vez mais veloz. Em pouco tempo, teremos que ter na estrutura um preparador físico. Aprender inglês é um atributo para quem pensa em chegar à Fifa. O mundo está globalizado. Em breve teremos árbitros nacionais e não mais regionais. Sonho com um intercâmbio internacional, com árbitros acompanhando o trabalho em outros estados e países.
21 – Como é feita a avaliação dos árbitros? Por que os documentos de avaliação não são divulgados na Internet?
R – O documento é divulgado para as comissões estaduais. Elas devem trabalhar na melhoria da qualidade da arbitragem. O documento é confidencial, pois ainda não temos uma cultura de divulgação ostensiva, mas chegaremos lá em breve.
22 – Como está o projeto de profissionalização dos árbitros?
R – Uma comissão nomeada pelo presidente Ricardo Teixeira e composta por Carlos Simon/RS, Evandro Roman/PR, Sálvio Spinola/SP, Carlos Pimentel/RJ, Milton Otaviano/RN, Carlos Berckembrock/SC e Luiz Kallemberg/SC tem um prazo de 120 dias para apresentar um projeto. Agora, com a legislação trabalhista atual, é inviável profissionalizar 416 árbitros em todo o País. Faça uma conta simples: se cada um receber R$ 1.000,00 (mil reais) por mês, com o pagamento dos tributos legais teremos uma despesa anual de aproximadamente R$ 16 milhões…., fora o INSS, FGTS, FÉRIAS, etc…. Se colocarmos as taxas e demais despesas, o valor quase dobra. Inviável neste momento, mas temos que apresentar sugestões e não apenas dizer que tem que profissionalizar. Por isto incentivamos a criação das Cooperativas e isto o Armando Marques já dizia, no final da década de 90.
23 – Como você avalia a experiência de os árbitros se comunicarem por rádio durante o jogo?
R – Excelente. Tudo que vier para somar e ajudar o árbitro de futebol temos que aprovar, incentivar e aplicar. O grande problema é o elevado custo, a manutenção etc. Podem ter certeza de que, antes de 2014, os preços cairão e será possível importar os comunicadores.
24 – Cabe exclusivamente à CA/CBF a indicação dos árbitros para o quadro da FIFA?
R – Sim. É simples. O árbitro internacional tem uma validade de um ano e pode sair no primeiro, no segundo ou no penúltimo ano. Tudo depende do desempenho técnico, físico e comportamental. Tudo é observado.
25 – Qual o critério usado para ser do quadro internacional?
R – Atualmente com regularidade na carreira dentro e fora das quatro linhas, aprovação nas avaliações, vagas disponíveis pelo jubilamento e aproveitamento da Conmebol e FIFA. Não adianta ostentar o escudo da FIFA e não sair do Brasil. Temos que trabalhar com ciclos. Um árbitro que não tem qualquer possibilidade de ir à uma Copa do Mundo deve deixar a lista, mas não pode ser abandonado. Tem que se respeitar, por isto estamos estudando um plano de carreira, com categorias, como, por exemplo, a categoria Especial para ex-árbitros internacionais que deixem a entidade antes dos 45 anos; retornar com o Aspirante-Fifa e criar mais duas subdivisões. Estamos estudando isto. Toda atividade tem uma estrutura – tipo pirâmede – e não pode haver apenas dois estágios. Agora, com um país continental não se pode demorar muito para um talento chegar ao topo, por isto estamos estudando como implantar a classificação nacional. Vamos conseguir, mas teremos muitas tempestades. Se você chegar em casa e a mulher mudar o sofá de lugar, a pessoa estranha, quanto mais mexer em algo que está em estado de letargia há mais de 10 anos.
26 – A indicação é puramente técnica ou tem política no meio?
R – A indicação deve ser técnica. Quando se fala em política parece que ela não existe. Existe sim e em todos os segmentos de nossas vidas, ou isto não existe na empresa, na escola, na vida social, pessoal, etc?. No futebol não é diferente, porém o mais importante é que os critérios de aprovação, por exemplo, sejam iguais para todos. Não se pode fechar os olhos para um árbitro e para outros não. Uma coisa é certa, toda promoção gera polêmica. Quem não vai, discorda. Quem vai, gosta. Se tirar, reclama. É a vida. Comparo isto a uma grande decisão do árbitro em uma partida. Ele marca ou deixa de marcar um tiro penal. Ele, por decidir, acha que está certo. O clube envolvido protesta. A diferença é que a decisão do árbitro não volta mais. A nossa pode ser revista um ano depois.
27 – Ao longo dos anos, tivemos grandes nomes da arbitragem no quadro internacional. Ao mesmo tempo, tivemos também nomes de qualidade duvidosa. Na sua opinião isso foi devido à política?
R – Opinião todos tem a sua. Tivemos seleções que o milhões de treinadores do Brasil diziam que o técnico esqueceu de levar “o” craque. Como disse em uma das questões acima, todos nós fazemos escolhas e somos responsáveis pelos acertos e erros.
28 – Na sua opinião, por que um nome como Dulcídio Wanderlei Boschilla nunca pertenceu ao quadro internacional?
R – Era um grande árbitro, com sete finais de Campeonato Paulista, uma do Brasileiro e realmente não foi internacional. Critérios de quem comandava o setor na época, portanto não posso comentar por absoluta falta de conhecimento dos motivos que levaram a tal decisão. Seria achismo.
29 – Este ano os paulistas Wilson Luiz Seneme e Ana Paula de Oliveria sairam do quadro por contusão. Voltando à normalidade, ele é um forte nome para o próximo ano?
R – Claro, o Seneme sabe que, em 2006, votamos pela sua inclusão. No teste físico realizado em setembro ele tinha duas datas para realizá-lo, dias 12 e 20. Disse-lhe para fazer no dia 20, pois teria mais oito dias para treinar e se recuperar caso não passasse. Ele foi valente e tentou, sem sucesso, agravando a contusão que estava quase sanada. Lamentavelmente não conseguiu no dia 20, quanto mais na última data, que seria cinco dias depois. A CA-CBF estabeleceu um critério e assim foi e será feito.
Como bem disse o presidente da FPF, o caso dele pode ser comparado a um craque que, na véspera da Copa do Mundo, sofre uma lesão e tem que ser cortado. Imagine só, a Copa do Mundo é jogada de 4 em 4 anos e nem sempre é possível para um jogador atingir o sonho de disputá-la.
30 – De 1994 a 2007, Wilson Mendonça, mesmo contestado por alguns, pertenceu ao quadro internacional. Por que foi retirado do quadro e ele volta como Básico?
R – O Wilson Mendonça sabe os motivos pelos quais ele deixou a FIFA. Existe um desgaste natural com todos e com ele isto estava acentuado, tanto que nem a Conmebol e nem a FIFA o utilizavam em suas escalas. A saída dele foi pelo conjunto da obra e não pelo ano em si. Quanto a volta no quadro Básico isto depende da Federação local, responsável pelas indicações. Ele atuando, sendo aprovado nos testes locais e sendo indicado poderá realizar o teste CBF e, se a CA-CBF desejar, designá-lo para os sorteios das Séries A, B e C.
Continua….