CBF EM DEFESA DO VAR: ‘TORNA FUTEBOL MAIS FRIO? SIM. E MAIS JUSTO’
O tom de seriedade e a confiança na voz de Leonardo Gaciba retratam bem a posição que o ex-árbitro assumiu no primeiro semestre deste ano. Aos 48 anos – aposentado dos gramados desde os 39 -, o gaúcho deixou a carreira de comentarista para assumir a presidência da Comissão de Arbitragem da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), cargo que ocupa desde o dia 9 de abril.
Além da tarefa de preservar a credibilidade e a confiança do torcedor na arbitragem brasileira, o agora dirigente assumiu uma missão ainda maior: pilotar o projeto do VAR, o árbitro de vídeo. A ferramenta, que tem como mote a redução de erros para promover maior justiça dentro de campo, foi implementada no Campeonato Brasileiro com o início da edição 2019.
“A oportunidade que o Campeonato Brasileiro está dando para a arbitragem é espetacular. Vamos terminar o ano com o maior número de jogos do mundo comandados sob o VAR. É uma oportunidade muito grande de crescimento muito rápido. São dez ou até mesmo vinte jogos por semana que nós temos de experiência”, analisa ele sobre as nove primeiras rodadas com a arbitragem de vídeo. No total, foram 89 jogos disputados.
Durante a parada do Brasileirão, a Fifa e a Conmebol viveram toda sorte de situações envolvendo a ferramenta na Copa do Mundo Feminina e na Copa América. A competição sul-americana, em especial, sofreu críticas tanto pelo uso excessivo, quanto pela ausência do VAR em determinadas partidas. Segundo o dirigente, a aplicação da ferramenta segue um estilo próprio nos jogos do Campeonato Brasileiro.
“Nós temos uma linha de intervenção um pouco diferente no Brasil, é fácil de observar isso. Procuramos utilizar uma linha mais “alta”, um pouco mais do que foi utilizada na Copa América. Mais para erros fáceis de serem observados pela TV e que não tenham lances interpretativos. São duas linhas de intervenção diferentes, mas as nove primeiras rodadas do Brasileirão mostraram bem qual linha a CBF está tomando.”
Para Gaciba, situações como a da partida entre Inglaterra x Camarões, na Copa do Mundo Feminina, são desnecessárias. No jogo, as camaronesas pediam a revisão de um gol legal das inglesas, revoltadas com a anulação de um lance de gol anterior.
“É um processo muito novo o projeto do árbitro de vídeo. O pessoal já está começando a perceber, aqui no Brasil especificamente, que todos os lances que tiverem relevância na partida vão ser observados pelo árbitro de vídeo. Sem sombra de dúvidas, estão sendo checados. Em especial naquela situação de Camarões, por ser um gol, que faz parte do protocolo e tem que ser checado em todos os detalhes. Então, não há necessidade da intervenção dos atletas, porque é protocolar que isso seja feito.”
Entre desafios logísticos, como a homologação de cada estádio com a Internacional Football Association Board para o uso do do VAR, a Comissão trabalha para previnir problemas como o que ocorreu na semifinal da Copa América, quando a arbitragem de vídeo perdeu a comunicação com o campo de forma momentânea antes da partida.
“Nós não tivemos esse problema ainda. Tivemos alguns menores, mas todos contornados antes do jogo, alguns detalhes. Nós temos um sistema de prevenção. Caso haja algum problema, nós temos um plano B, que é um contato através de walkie talkies, no qual a cabine do árbitro de vídeo pode falar com o árbitro reserva, que continua a comunicação com o árbitro do campo. Não tivemos a necessidade de utilizar em nenhum desses 89 jogos, mas é um processo constante em busca da excelência.”
Embora a experiência com a arbitragem de vídeo tenha sido positiva na maior parte do tempo, o Brasileirão já teve sua primeira grande crise envolvendo o VAR.
Na derrota para o Palmeiras por 1 a 0, um pênalti marcado para os paulistas por meio do vídeo revoltou os dirigentes cariocas, que foram ao Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) pedindo a anulação da partida por um suposto erro de direito, já que o jogo já teria sido reiniciado antes da marcação da penalidade, após revisão, o que não seria permitido. O tribunal manteve o resultado.
– Foi feito o julgamento e houve uma vitória de 9 a 0 de que não houve um erro de direito, um erro para suspender a partida. É um processo novo. O mais interessante de tudo é que o tribunal tenha visto que foi feito justiça dentro do que aconteceu. Isso é o mais importante. Não podemos perder a grande justiça, o objetivo geral do VAR, conseguir enxergar o que o árbitro não enxerga dentro do campo de jogo. Foi o que foi feito naquele jogo. Acho que o julgamento foi justo – analisa Gaciba.
Entre novas turmas de árbitros aptos a utilizar o VAR formadas e um índice de acertos em decisões capitais que chega a 97,1%, segundo balanço da própria entidade, a Comissão de Arbitragem comemora o sucesso do início do projeto no Brasileirão. O grande desafio, agora, explica o presidente, é respeitar a fluência do jogo.
“Nós ainda estamos em um processo muito novo. Essa é a luta constante, dar fluência ao futebol. Seria perfeito se não precisasse da ajuda do VAR, mas em algumas situações a gente precisa. Que a gente consiga ser o mais rápido possível, nunca abrindo mão da precisão que o árbitro de vídeo nos dá. Isso é o mais importante, a precisão. Torna o futebol mais frio? Sim, mas sem dúvida, torna o futebol mais justo.”